As redes sociais são, simultaneamente, a melhor e a pior coisa que já nos aconteceu.
E sim, produzir conteúdo para redes sociais pode ser muito desgastante. E frustrante. E entusiasmante, ao mesmo tempo!
A pior parte é termos a perfeita consciência de que estamos encurralados. Fizemos tanta apologia do seu extraordinário potencial. Que agora não podemos apagar do nosso histórico e fingir que nunca fomos defensores. E o resultado é que já não lhes escapamos. Se não for como utilizador. Como produtores de conteúdo certamente.
E a verdade é apenas uma. Ou fazes deste inevitável um processo criativo e do qual retiras prazer e, acima de tudo, dados. Ou então prepara-te para a exaustão que não tardará em chegar.
Há um padrão na forma como produzimos conteúdo para redes sociais.
Encontra o teu.
Ciclos de euforia
Este é o meu. Há fases, que normalmente correspondem a estados de maior força anímica. Os ciclos de euforia. Nestas fases, produzo conteúdo em catadupa. Sem qualquer esforço. Sai naturalmente. Normalmente dura entre duas a três semanas. E logo a seguir sou capaz de estar dois meses cristalizada. Sem que me apeteça sequer imaginar que tenho que publicar.
Vira o disco e toca o mesmo
Este é o modelo que mais encontro. Há um modelo pré-definido. Aquilo a que chamamos plano de conteúdos. Que resulta de um misto de experiência feita e do que vemos outros – com alegado sucesso – fazerem. E que repetimos até à exaustão. A maioria das vezes privilegiando o que menos importa. O que chamo de supremacia da estética sobre a utilidade. Importa é que seja bonito. Se resulta ou não, logo se vê.
Maria vai com as outras
Não há muito para dizer aqui. Hoje vemos alguém fazer uma live com milhares de visualizações e tentamos a nossa sorte. Amanhã sai uma atualização do Instagram que diz que os reels com polls é que estão a dar e passamos duas semanas a fazer reels com polls. No dia seguinte fazemos a clássica quote inspiracional. E nunca chegamos a ser nada para ninguém. Porque, em primeiro lugar, não somos nada para nós mesmos.
Clichés e factos
A grande maioria das marcas entra nesta categoria. Repetindo, mais uma vez, um modelo – normalmente o das 3/4 publicações por semana (segunda, quarta, sexta e sábado) – limita-se a clichés e factos. Sempre muito numa perspetiva egocentrada do “fizemos”, “estivemos”, “conquistamos”, “acontecemos”. Eu, eu, eu.
É raro, muito raro. Ver alguma coisa que saia fora destes modelos e que se destaque.
Certo que temos a Control, mas a Control é um mundo aparte. Encontrou o seu filão e mantém-se absolutamente fiel. CONSISTENTE. E por isso, mais até do que qualquer outra coisa, mantém o sucesso, a interação, o espaço exclusivo que dificilmente alguma outra marca lhe roubará. E repare-se como em momento algum. Em momento algum mesmo. Na produção de conteúdo para redes sociais. A Control fala, promove ou tenta vender preservativos.
Agora que identificaste o teu modelo de produção de conteúdo para redes sociais,
Há três coisas que podes começar a fazer hoje. Ou, se já fazes, talvez perceber como podes aprofundar. Deixar a superfície. E mergulhar nas profundezas. Para tornar a produção de conteúdo para redes sociais num processo que realmente te traga os resultados que desejas. E não, não são mais vendas. Não é para isso que, diretamente, as redes sociais servem.
Sê estratega
Um plano de conteúdos é uma ferramenta brutal. Sim, é. Mas não de per si. Um plano de conteúdos faz-se da seguinte forma:
- Qual é o objetivo maior para este mês? Há novidades relevantes? Há uma oferta para destacar? Há uma data temática que pode apoiar alguma estratégia de marca ou negócio? Há algum assunto que, no mês anterior, se tenha destacado como interesse maior da minha comunidade?
- Em cima disto, há dados de tração e interação que me permitam saber exatamente que tipo de conteúdo atrai mais a atenção da minha comunidade e que eu devo considerar para passar a mensagem que pretendo passar?
- Em cima disto, há dados que me permitam perceber o período – dia, horário – em que a minha comunidade está mais ativa nas redes sociais?
- E ademais, há algum canal (online ou offline) onde eu esteja, de acordo com os dados, a ganhar tração ou a ter melhor desempenho e que justifique o meu foco e/ou reorientação estratégica?
Reproposita
Volto a partilhar a pirâmide do conteúdo para que percebas que o trabalho de um produtor de conteúdos para redes sociais é, acima de tudo, um trabalho de análise e reciclagem.
Começa por um conteúdo de longo formato. Aquele em que te sentires mais confortável. Pode ser um artigo de blog, um poadcast, um vídeo de Youtube, um white paper. Seja como for, sai da rama e desce ao fundo da questão. Cria a partir de um espaço de empatia. Foca-te não tanto no que queres dizer mas no benefício claro e imediato que o leitor pode retirar da tua criação. Só assim haverá conexão.
Depois de teres esta peça maior de conteúdo, aplica a regra bits and pieces. Em função do perfil de utilização do canal. Em função do estilo que adotaste para a tua marca. Mas, sobretudo, em função do modelo de apreensão cognitiva da tua comunidade. Cria pequenos trechos de conteúdo a partir do conteúdo maior e dá-lhes rede. Ou seja, liga-os sempre ao conteúdo maior, onde quer que ele esteja.
Liberta-te do ego
A pior coisa. A pior mesmo. Que ainda vejo todos os dias. Mesmo num tempo e espaço em que temos tantos dados disponíveis. A pior coisa é mesmo o conteúdo egocentrado de que já falei acima. “Somos”, “fizemos”, “estivemos”, “conquistamos”, “acontecemos”. Eu, eu, eu.
Ainda ontem passava pelo Linkedin só para encontrar mil e um exemplos de empresas que poderiam ocupar um território único de inspiração. Porque arrastam legiões ou porque integram milhares de pessoas a bordo. Mas sempre mais do mesmo.
Um dos conteúdos – não interessa de que marca – vangloriava as políticas de felicidade e responsabilidade para com um ambiente saudável. Sou do tempo em que era eticamente correto nunca. Mas nunca. Aproveitar a responsabilidade social para ganhar a aprovação pública. A responsabilidade social interna de uma empresa é demasiado importante para ser usada assim.
Um conteúdo que mostra um ambiente saudável num contexto organizacional não é importante? Não deve ser partilhado? Deve sim. Até porque está provado que conteúdos de backstage, que mostram a vida real de pessoas reais por detrás das empresas ou marcas, são dos que mais entusiasmam as comunidades. Somos voyeurs por natureza. Por isso sim, deve ser partilhado. Mas não assim.
Um conteúdo destes ganharia outra vida, outra energia e outra relevância se, em vez do “olha que espetaculares que nós somos que oferecemos isto aos nossos colaboradores”. Desse palco. Só a título de exemplo. A um desses colaboradores. Para sem filtros. E medo de outras repercussões. E nas suas palavras. Descrever o momento. O que sentiu. Como acha que estas iniciativas contribuem. Ou, eventualmente, e apenas, como viu os seus colegas experienciar a iniciativa.
Show, rather then tell.
Bem sei que estamos longe desse espaço de liberdade e singularidade. Mas sou uma otimista. E acredito que há tanta vontade. Vejo, sobretudo no Linkedin que é o melhor barómetro nestas matérias, tantas pessoas solidarizarem-se e emocionarem-se com publicações que destacam o lado humano das organizações. Que faz-me manter otimista e acreditar que esse tempo vai chegar.
Em jeito de bónus.
Não podes estar em todo o lado ao mesmo tempo.
Ou, pelo menos, com intenção. Significado e resultados. Quando as redes sociais surgiram. Lembro-me bem desse tempo. De repente houve uma corrida desenfreada das poucas empresas que, por essa altura, tinham. Ou estavam conscientes da importância de ter um website. Uma corrida desenfreada a criar contas em tudo o que era rede social. Só para exibir a coleção de símbolos no cabeçalho. E por vezes repetida no rodapé do website.
Não importava propriamente se depois as pessoas lá entravam e tinha apenas um vídeo de mil novecentos e troca o passo. O importante era estar. É como aqueles eventos que não servem para nada. Mas onde tens que estar para ver e ser visto.
O tempo passou. Felizmente. Mas a tendência nem por isso.
E porque dedicamos muito tempo a criar sem significado. E muito pouco tempo a estudar verdadeiramente o perfil emocional e cognitivo dos nossos clientes ideais. Menos tempo ainda a saber quem realmente eles são. E menos ainda, infelizmente, a ler dados e definir prioridades. Continuamos a estar em mais redes do que deveríamos. Em mais redes do que temos tempo, recursos e energias para gerir. Em redes que, muitas vezes, não contribuem sequer para a nossa reputação digital. Prejudicam-na até. É como vendermos impressoras e gastarmos 20% do nosso orçamento a participar numa Feira de Turismo.
Acho que fiz o meu ponto.
Com propósito. Alavancado na proposta única de valor de uma marca. Na sua singularidade. Não naquilo que a torna mais do mesmo. Mas naquilo que a faz ser mais do menos.
Orientado para a transformação provocada na vida do cliente ideal. Do cliente ideal. Não de todos os clientes ideais possíveis, dos 8 aos 80.
Criar conteúdos para redes sociais pode, de facto, ser um processo entusiasmante e, mais que isso, um pilar essencial para galvanizar a experiência social de uma marca. Eu diria que muito mais opinião e emoção. E muito menos cliché e factos.
Somos seres humanos. Emocionamo-nos com o outro.
Rimos quando vemos um gatinho fazer diabruras num vídeo de stories. Choramos quando vemos uma criança num reels brincar nos destroços de uma guerra sem sentido. Voamos quando encontramos quem é capaz de mostrar-nos, num carrossel de imagens, o local feeling num destino de viagem. Não conseguimos deixar de elogiar e partilhar quem, num vídeo de dois minutos, é capaz de dar-nos uma forma real e imediata de resolvermos um problema.